Vou descendo para dentro de mim em uma espiral frenética... Horas se passam, anos se passam e eu nunca paro, nunca alcanço o fundo. Não sei do meu limite. Durante a queda eu só desejo atingir o chão com toda a minha força, fazer o baque ecoar em toda a minha existência. Queria chegar no piso, no centro do erro.
Acredito que esse piso seria quebradiço em determinadas partes e incrivelmente resistente em outras mas sobretudo ele seria quente e acolhedor como se implorasse para ser tocado. Seria o chão perfeito para se deitar e ler. Haveria contudo de se tomar muito cuidado porque ele poderia se quebrar a qualquer momento. Vale ressaltar que esse chão seria também instável, bem intencionado mas inclinado à tragédia, tendencioso a engolir ou rasgar com sua superfície escabrosa quem nele deitasse.
Sobre esse chão haveria uma estante com semblante cansado. Catatônico. Eu sei que se olhasse para ela sentiria que ela decepcionou-se com os volumes que guarda. Nesses livros estaria registrada toda a minha vida. Cada pensamento e diálogo, cada decisão. É por isso que a estante seria tão melancólica: pois ela vê o eu que ninguém mais vê. Eu sei também que ela seria triste por saber da minha dor, saber do peso que levanto nos calcanhares a cada passo. Sei que eu gostaria de ler todos os livros que ela castamente carrega... Rabiscaria muitos deles e sei que com lágrimas eu borraria algumas páginas.
Assim eu imagino o centro, o cerne de todo meu erro... Mas a estante ainda espera minha visita e o piso permanece inalcançável.
Eu continuo caindo e girando no vazio.